sábado, 22 de janeiro de 2011

Tempo de madureza



“Todos precisamos encontrar uma solução para o inibidor medo da passagem do tempo, que é afinal medo de viver. Preferíamos nem viver para não gastarmos a alma. Mas como é que se pode ter vontade, se parece que a cada dia a gente perde alguma coisa?

Tenho hoje uma lista de pessoas que amei e que se afastaram ou morreram; se eu chegar aos 80 anos, ela certamente terá crescido. Mas tenho uma doce lista de pessoas que chegaram: não só netos, mas novos amigos de todas as idades. Sem falar nas inovações tecnológicas, nas descobertas que tentarei acompanhar, nos livros por ler, nas coisas a fazer.

Mas como é possível que algo melhore com a idade? Embora muitas vezes me atrapalhe, erre, cometa todas as futilidades imagináveis, não tenho a afobação nem a insegurança dos 20 anos. Nem aquela simpática pontinha de arrogância que faz com que, jovens, pensemos que o mundo é nosso – e nos deve homenagens.

Meu corpo está mudando como está desde que nasci. Meu coração se transforma a cada experiência. Mas ainda palpita, se sobressalta e se assusta. Ainda sou vulnerável ao belo e bom, ao ruim e ao decepcionante, como quando eu tinha 10 anos. 

Somos isso: somos essa mistura, essa contradição, essa indagação permanente. Estamos vivos. Tem algumas vantagens, esse tempo de madureza de que fala o poeta.

Que liberdade não ter mais que decidir caminhos profissionais; parir e criar filhos, comprar casa, apertar orçamentos; temer a vastidão do futuro – e haveria lugar para mim dentro dele?

Muita coisa que em seu tempo foi dramática,  hoje é lembrança que me faz sorrir compadecida com aquela que se enrolava em tantas trapalhadas. 

Tive perdas, e se multiplicam com o passar do tempo. Tive ganhos, num saldo que não me faz sentir injustiçada. Especialmente, não perdi essa obstinada confiança que me impele a prosseguir quando o próximo passo parece difícil demais.”

Livro: Perdas e Ganhos
Autor: Lya Luft  

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